Por Kleber Maia

Todo homem pode crer em Cristo e, assim, alcançar a salvação. Porém, qualquer pessoa só pode crer no Salvador e permanecer fiela Ele por causa da graça divina (o favor imerecido de Deus). Sem ela é impossível alguém estar em Cristo e é igualmente impossível manter a comunhão com ele.

A salvação começa, pois, com o dom gratuito da graça preveniente que Deus concede a todos os homens, pela ação do Espírito Santo, que nos aproxima de Deus, ou nos atrai para Ele, despertando nas nossas almas a necessidade dele. Esta graça, assim como toda a graça, pode ser resistida. Mas se permitida a fazer a sua obra, a graça preveniente conduzirá o homem a convencer-se da sua própria pecaminosidade e incapacidade longe de Deus e o levará ao arrependimento e conversão.

É só a graça, através da fé, que nos capacita a nos arrependermos de nossos pecados, reconhecendo que o viver pecaminoso nos afasta de um relacionamento correto com Deus e abandonando estas práticas que O desagradam. Isto não é alcançado pelo simples esforço do homem, mas pela fé, que para João Wesley significa um relacionamento dinâmico e cooperativo que temos com Deus na nossa própria salvação. Ele estava bastante familiarizado com os escritores da Igreja Primitiva e seus ensinos sobre a santidade e com eles aprendeu sobre o potencial da graça de Deus de possibilitar e capacitar o ser humano a ter uma vida santa, através da cooperação entre a graça e a resposta humana.

A cooperação humana com a graça divina começa por simplesmente não resistir a ela, à ação do Espírito Santo, e continua quando buscamos crescer “na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.” (2 Pe 3.18). Nesta cooperação divina/humana, “a pessoa cresce de forma incremental e por graus à medida que responde às iniciativas de Deus”. “Essa obra junto com Deus não brota da iniciativa humana, mas emerge da resposta à prévia ação divina” (COLLINS, 2010, p. 380).

Wesley afirma que Deus, somente, tem toda a glória pela salvação do homem, embora este “trabalhe juntamente com Ele”, pois o poder para trabalhar com Deus vem dele mesmo (WYNKOOP, 2012, p. 213). Ele questiona: “Como pode ser maior a glória de Deus salvar o ser humano irresistivelmente, do que salvá-lo como um agente moral livre, mediante tal graça como aquela com que este pode concordar ou resistir? Temo que vocês tenham uma noção confusa, não bíblica, de ‘a glória de Deus’” (Ibid, p. 214).

Na epístola aos Hebreus, que foi escrita para cristãos judeus e tem forte caráter exortativo, encontramos muitas advertências para os cristãos, prevenindo-os contra a indolência e negligência espiritual, bom como ao endurecimento do coração e apostasia. Em sua primeira advertência,contra a negligência, ele asseveraque devemos “atentar com mais diligência para as coisas que já temos ouvido, para que em tempo algum nos desviemos delas” (2.1). O termo aqui traduzido como negligência “é claramente enfática e significa tratar com completo desrespeito ou desdém [a Palavra de Deus], qual o que faz supor a apostasia” (WILEY, 2009, p. 101). É o mesmo termo usado para designar o descaso dos convidados para as bodas, na parábola das bodas contada por Jesus (Mt 22.5), e “traz em si a ideia de menosprezo, mais do que a noção de recusa do convite”. (Idem). Outra grande advertência desta epístola é que os cristãos não devem endurecer o coração, quando ouvirem o Espírito Santo (3.8, 13,15) e nem devem ter um coração incrédulo para se apartar de Deus (3.12). O termo “endurecer” expressa “o estado de incredulidade empedernida ou oposição obstinada à Palavra de Deus” (WILEY, 2009, p. 172). Para Wesley, o coração incrédulo, neste texto, “é a ‘tendência para pecar’, pois tende a resultar em pecados reais, que trazem culpa e condenação”. (WILEY, 2009, p. 179). A epístola censura os cristãos por não prosseguirem até a perfeição cristã e alerta contra o perigo da apostasia, mesmo para aqueles que provaram de Cristo e do Espírito Santo, pois para aqueles que rejeitam as misericórdias expiatórias manifestas por Cristo na cruz, não há salvação possível (6.4-6).O escritor alerta, ainda, que uma vida contínua e deliberada no pecado trará condenação certa, mesmo para aqueles que receberam realmente a verdade do evangelho, pois “rejeitar Aquele que é o único remédio para o pecado, oferecido pelo amor de Deus mediante o sangue derramado de Cristo, é excluir-se para sempre de toda esperança de salvação”. (WILEY, 2009, p. 453).Este autor sagrado lista uma série de atitudes que os cristãos devem ter, a fim de se manterem firmes na sua fé: eles devem reter firmes a sua confissão de fé (4.14), deixar o pecado e o embaraço, que podem fazê-los tropeçar (12.1), devem considerar a Cristo para não enfraquecer e desfalecer (12.3), devem reter a graça e servir a Deus com reverência e piedade (12.28).

Ainda o escritor bíblico fala de muitas atitudes que os cristãos devem evitar, a fim de não se afastarem de Cristo: devem se esforçar para nunca cair no mesmo exemplo de desobediência dos israelitas no deserto (4.11), não devem deixar a sua congregação (10.25), não devem se privar da graça divina (12.15), não devem ser pecadores ou profanos (12.16), não devem rejeitar a Deus, quando Ele fala conosco (12.25) e nem devem se deixar levar por doutrinas estranhas (13.9).O texto de Hebreus também mostra algumas condições que se esperam dos fiéis: Os fiéis devem obedecer a Cristo, pois Ele é a causa da salvação para os que obedecem (5.9); Os iluminados devem produzir erva proveitosa e não espinhos (6.7,8). Na parábola do Semeador (Mt 13.22), o Senhor Jesus explica que o que produz espinhos é o que permite que a preocupação com as coisas materiais e a sedução das riquezas sufoquem a sua fé; Eles devem mostrar o mesmo cuidado até o fim, para certeza da esperança (6.11); Os que foram iluminados (10.32) sofreram perseguições, permitiram a espoliação dos seus bens com alegria, buscando uma herança nos céus, mas não devem rejeitar a confiança em Deus, e sim perseverar (ter paciência) para alcançar a promessa (10.36); Se o justo recuar Deus não tem prazer nele (10.38).

Assim, vemos que o escritor desta epístola adverte os seus leitores que eles tem algo a fazer, cooperando com a graça que têm recebido de Deus. A graça é o meio pelo qual eles recebem força para fazer estas coisas (13.9), mas isto não elimina a necessidade de que eles façam isto e eles não podem rejeitar ou se privar da graça divina (12.15). Pelo contrário, devem retê-la (12.28).

A graça nos faz responsáveis pelo nosso pecado perante Deus. Todo homem nasce numa condição de pecado original que faz dele alguém tão depravado que não pode deixar de escolher o mal. A graça preveniente restaura-nos para um arbítrio liberto, de modo que podemos escolher entre o mal e o bem. Sema graça não podemos escolher fazer o que agrada a Deus, mas com a graça preveniente podemos (e devemos) escolher obedecer aos mandamentos divinos.

A Epístola aos Hebreus diz que Cristo, pela graça de Deus, morreu por todos (2.9).Todo homem, pois, recebe de Deus a condição de cooperar com Ele para sua salvação, ou de rejeitar a graça divina, para sua eterna perdição.

Editora Sal Cultural - Coleção Grandes Temas da Teologia

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