Por H Ray Dunning
A publicação original de Uma Teologia do Amor, escrita por Mildred Bangs Wynkoop, em 1972, foi um marco para a teologia da santidade. Nunca antes desde Phoebe Palmer (1807-1874) uma mulher causou um impacto tão grande no movimento de santidade. Assim como a senhora Palmer, a doutora Wynkoop propôs um mudança de paradigma no entendimento que resultou no que ela gostava de chamar de “correção no meio do caminho” na doutrina da santificação. Ela reconheceu que a teologia da santidade havia adquirido uma característica a qual ela nomeava de “escolasticismo da santidade”. Ela definiu este fenômeno como um tipo de rigidez desenvolvido na compreensão de santidade que veio depois da época de Wesley e que invadiu completamente a América. Esta mentalidade, concluiu ela, resultou em um “perfeccionismo” que causou grandes problemas na igreja, levando a produzir “neuróticos espirituais, fariseus e hipócritas”.
Seu estudo sobre a obra de John Wesley a fez reconhecer que a teologia autêntica wesleyana fez uma intersecção com a vida de um grande modo existencial se comparada à linha dominante de ensino estereotipado do século IXX e do começo do século XX. Ao descrever esta situação, ela criou o termo “lacuna de credibilidade” [credibility gap], que se tornou parte da terminologia padrão dos teólogos da santidade.
Esta terminologia tem uma aplicação dupla. Ela descreve a lacuna entre o que foi descrito como “clamores extravagantes” pela inteira santificação e a real experiência de muitas pessoas. Ela também se refere à lacuna entre os argumentos para a inteira santificação e a boa interpretação bíblica.
A origem da primeira lacuna foi a redescoberta da “intratável natureza do pecado”. O período histórico em que o reavivamento da santidade começou foi, por uma boa razão, conhecido como a era do progresso, um período caracterizado como altamente otimista, com uma crença confiante na perfectibilidade da natureza humana. Muitos fatores contribuíram para a perda deste otimismo no caráter geral do mundo, incluindo a emergência de um senso mais profundo das obscuras, e sempre insuspeitas, profundezas da personalidade humana. Esta consciência é a base para uma declaração chocante de Henry H. Knight III de que “nossa presente apreciação da função dos motivos inconscientes em nossas vidas faz da fala de Wesley sobre a perfeição cristã parecer desesperadamente ingênua, e até perigosamente presumível”.
A segunda lacuna foi destacada por W. M. Greathouse em um estudo apresentado em 1969, na Conferência Teológica Nazarena. Ele argumentava que uma fonte de grande negativismo em relação ao “movimento de santidade” vinda dos estudantes de fora constituía “sua falta de ampla e profunda base bíblica”, por meio da qual “reduz-se a verdade mui esplendorosa das escrituras sobre a santificação a uma simples ‘benção secundária’ compreendida como um tipo de ‘experiência’ impermeável que nos manterá seguros até Cristo voltar para reunir um pequeno rebanho de especialistas da santidade”. Ele adicionou mais uma observação: “Uma cuidadosa leitura da obra de Wesley, Plain Account (sobre Perfeição cristã) revelará rapidamente a seriedade com que esta ‘teologia popular’ saiu da visão wesleyana mais bíblica de santificação”.
Dra. Wynkoop reconheceu que o futuro do movimento de santidade dependia do preenchimento desta lacuna e o considerou como seu chamado.
Ela tirou sua interpretação baseada em Wesley, mas em suas próprias palavras, ela não o via como um “guru” e, sim, como um “mentor”. Isso significava que, como Wesley, ela deu uma ênfase primária para a autoridade das Escrituras e, nessa mesma base, ofereceu crítica relutante a Wesley em alguns pontos, notavelmente à tendência dele em falar do pecado em termos substitutivos. Seu treinamento filosófico a levou a ver que havia numerosos problemas com este modo de pensar e descobriu que um pensamento relacional era mais consistente tanto com a fé bíblica como com a vida prática.
Assim como todos os desafios aos modos tradicionais de teologia, o trabalho dela encontrou muita oposição, tanto entre teológicos acadêmicos como pastores comuns. Até mesmo um de seus companheiros teólogos e amigo de longa data a acusou de ser a causa principal da “morte do movimento de santidade”. A maioria dos estudiosos e pastores mais jovens e mais criteriosos ouviu a voz Wynkoop como um fôlego de ar fresco. Muitos declararam que seu livro se tornara o meio de se preservar a mensagem da santidade do coração. Seus amigos na Sociedade Teológica Wesleyana (Wesleyan Theological Society) a honraram de várias maneiras e anualmente reconheciam uma publicação excepcional com o Prêmio Literário Wynkoop (Wynkoop Book Award).
Dra. Wynkoop foi uma pioneira. Ela acendeu a chama de um caminho que alguns de nós temos tentado seguir. Assim como a maioria dos esforços pioneiros, seu trabalho chama a um maior esclarecimento e desenvolvimento. Pode haver áreas que pesquisas mais aprofundadas mostrarão a necessidade de correções. No entanto, os problemas que ela abordou eram reais e tinham grande necessidade de resolução. A direção que ela apontou era sensata, e se o movimento de santidade sobreviver pelo século XXI, uma das maiores razões será porque Mildred Wynkoop teve a coragem de desafiar a tradição e trilhar um novo caminho.
A republicação [1] de sua obra magna é uma feliz ocasião para pastores e mestres mais jovens tomarem ciência não apenas de uma grande senhora e estudiosa, mas também da origem de um ponto de virada essencial no movimento moderno de santidade. Como um colega mais jovem de Mildred enquanto ela escrevia este livro, eu fui profundamente influenciado por nossas conversas e estou honrado em poder recomendar o trabalho dela ao leitor.
* Este texto é um prefácio a segunda edição americana da obra The Theology of Love (2015 by Beacon Hill Press), tradução de Aline Grippe.
[1] A Editoral Sal Cultural lançara este título no transcurso de 2017.